De acordo com o professor José Roberto Simões Moreira, da Poli-USP, o objetivo é baratear o processo de reforma a vapor com insumo da energia solar concentrada.
Um dos processos mais comuns de síntese do gás natural é a chamada reforma a vapor, na qual se realiza uma reação química de vapor de água com o gás metano (CH4). Esse processo produz dois gases (chamados gases de síntese, ou syngas): CO e H2 (monóxido de carbono e hidrogênio). Ambos são matéria prima para a indústria química, petroquímica e siderúrgica, com diversas aplicações. O hidrogênio, inclusive, é chamado de combustível do futuro, num cenário de economia sem carbono. Ambos também podem ser utilizados em sistemas para geração de energia elétrica, acionamentos de turbinas, motores e outros processos que envolvem combustão.
“A reforma a vapor demanda muita energia, porque as reações químicas ocorrem em torno de 800 °C, uma temperatura bastante elevada. Geralmente, a energia necessária para obtenção dessa temperatura vem da combustão de fósseis, muitas vezes do próprio gás natural. Nossa proposta é que a demanda energética necessária para isso seja prioritariamente de origem solar”, explica o professor José Roberto Simões Moreira, do Laboratório de Sistemas Energéticos Alternativos (SISEA) da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP).
Simões e sua equipe são responsáveis pelo projeto Chemical Process: A Hybrid Solar System for Natural Gas Steam Reforming, um dos 28 projetos já iniciados pelo Centro de Pesquisa para Inovação em Gás Natural (“Research Centre for Gas Innovation” – RCGI, na sigla em inglês – www.usp.br/rcgi). Eles estão começando a construir o primeiro simulador de energia solar concentrada do Brasil, um protótipo em nível laboratorial, para obtenção de syngas.
Para isso, vão usar um refletor paraboloide de cerca de 1,5 metro de diâmetro, quatro lâmpadas de xenônio, que emitem radiação térmica e luminsosa, cujas características se aproximam da radiação solar, e um reator de material cerâmico para a qual a radiação irá convergir, depois de refletida (um tipo de reator termoquímico).
“Idealmente, toda a energia para a reação poderia vir do sol. Mas o sistema é híbrido porque pode ser que tenhamos de usar combustão de fósseis para gerar uma parte dela. O que sabemos é que, com a energia solar, o custo energético certamente será menor do que o observado no método tradicional. O quão menor, ainda não podemos dizer, isso é uma das respostas que queremos ter”, diz Simões.
A ideia é reduzir o insumo energético necessário para cada unidade de gás de síntese produzida. De acordo com Simões, quando o céu está bem limpo, no Verão, o sol envia para a Terra (em radiação) cerca de 1000 watts de potência por metro quadrado no nível do solo. Isso entre 13h e 14h, quando temos as melhores condições. “Mas, com o uso do prato paraboloide, é possível transformar esses mil em 10 mil sois, por meio de concentração”.
É pura ótica. Quando raios luminosos incidem sobre uma superfície côncava, ela os reflete e os concentra em um único ponto (foco). Quanto maior a superfície, maior será a concentração de energia. Nesse ponto, será colocado um pequeno reator de material cerâmico (chamado de cavidade), onde a radiação ficará aprisionada e as reações químicas ocorrerão. “A cavidade simula um corpo negro: a abertura da cavidade fica no foco do paraboloide e a radiação vai ser absorvida ali.”
Para a construção do protótipo, será usada uma sala de aproximadamente 15 m² do SISEA, que está sendo reformada e adaptada, inclusive aos protocolos de segurança que o experimento exige. O projeto tem duração de cinco anos, mas a equipe pretende ter tudo pronto, e em funcionamento, em quatro anos. “Queremos dominar essa tecnologia para que as grandes produtoras de gás natural, como a BG, que patrocina o projeto, se interessem e, no futuro, desenvolvam suas plantas. Este é um assunto de pesquisa de ponta no exterior: o uso de energia solar para promover reações termoquímicas e, num sentido mais amplo, para a produção de combustíveis solares”, ressalta Simões.