Pesquisadores analisaram impactos da criação de rotas no interior de São Paulo em que os veículos pesados usassem GNL em lugar do diesel.
A substituição do óleo diesel pelo gás natural liquefeito (GNL) no transporte de carga no interior de São Paulo possibilitaria uma redução significativa no custo do combustível e nas emissões de gases de efeito estufa (GEEs) e outros poluentes. É o que mostra um estudo do Fapesp Shell Research Centre for Gas Innovation (RCGI), no qual foram analisados quatro cenários. “No melhor deles, a adoção do GNL reduziria em até 40% o custo do combustível, 5,2% as emissões de CO2 equivalente; 88% as de material particulado; 75% as de óxidos de nitrogênio (NOx); e eliminaria as emissões de hidrocarbonetos”, afirma Pedro Gerber Machado, um dos pesquisadores envolvidos no projeto.
O estudo, que resultou em um artigo publicado na revista internacional de ciência ambiental Science of Total Environment, teve o objetivo de avaliar os benefícios econômicos e ambientais da substituição do óleo diesel pelo gás com vistas ao estabelecimento de um Corredor Azul no Estado – conceito que surgiu na Rússia e designa rotas em que os caminhões usam GNL em vez de diesel.
“A metodologia considerou inicialmente dois contextos: um para as regiões geográficas servidas por gasodutos, chamada de Cenário Restrito (RS); e outro abrangendo as 16 regiões administrativas do Estado, chamada de Cenário Estadual (SS). Os dois cenários originaram diferentes versões do Corredor Azul, com respectivamente 3.1 mil e 8.9 mil quilômetros de estradas”, explicou Machado.
Segundo ele, para cada cenário foram consideradas duas formas de distribuição de GNL: a primeira foi a liquefação centralizada com distribuição rodoviária, que gerou dois sub-cenários, um Cenário Estadual com Liquefação Centralizada (SSCL) e um Cenário Restrito com Liquefação Centralizada (RSCL). E a segunda seria realizar a liquefação localmante, na região em que ele seria usado, o que dispensaria a necessidade de distribuição de GNL por rodovias. Dela derivam dois outros cenários: o Cenário Estadual com Liquefação Híbrida Local e Central (SSHL); e o Cenário Restrito com Liquefação Local (RSLL).
Custos comparados – “O cenário denominado RSLL apresenta a menor média de diferença de preço para o consumidor final entre o GNL e o diesel, o que significa que, neste caso, o processo de entrega do GNL é mais caro, influenciado pelo fator de escala e por maiores custos operacionais”, explica Machado.
Já o cenário RSCL oferece o menor preço de gás para o consumidor final, de 12 dólares por MMBTU (milhão de unidades térmicas britânicas), ao passo que o diesel, neste mesmo cenário, custaria 22.01 dólares por MMBTU. A diferença entre o preço do GNL e do diesel nesse cenário também é a maior de todas: 10.01 dólares por MMBTU”, revela Pedro.
Entretanto, o cenário RSLL foi desenhado no contexto de um corredor com menor extensão, e o investimento seria de USD 243.4 por metro. Ao contrário do que acontece no SSHL, que tem o menor valor de investimento por metro entre os quatro cenários (USD 122.1/m).
Emissões evitadas – Machado explica que para o cálculo das emissões de GEEs e dos poluentes, foram levados em conta apenas os dois macrocenários: SS e RS. “Quando se trata do uso de GNL, as emissões de GEEs diferem das de diesel por conta do CH4 e do N2O, gases de efeito estufa com potencial de aquecimento global. Se o combustível utilizado é o diesel, o CO2 é responsável por 99% das emissões de CO2-eq, e se o combustível usado é o GNL, ele representa 82% das emissões de CO2-eq, enquanto o CH4 é responsável por 10% e o N2O por 8%”, afirma.
Já no tocante às emissões de GEEs da logística de transporte do GNL, o pior caso se refere ao SSCL, e corresponde a 1% do total de CO2-eq emitido com o uso de caminhões. No SCHL, a logística representa 0.34% das emissões, e no RSCL, a logística corresponde a 0.28% das emissões.
Quanto aos poluentes, no RS seriam evitadas 119.129 toneladas de emissões de material particulado (MP), 7,3 milhões de toneladas de NOx e 209.230 toneladas de hidrocarbonetos (HC). No cenário SS, os benefícios são ainda maiores, com reduções de 163 mil toneladas de MP, 10 milhões de toneladas de NOx e 286 mil toneladas de HC.
A redução de 5.2% nas emissões de GEEs, observada no Cenário Estadual quando se compara a combustão de gás natural e a de diesel, talvez não seja um resultado tão grandioso, mas há reduções consideráveis de poluentos locais NOx, PM e HC: respectivamente de 75%, 88% e 100%.
“Os maiores benefícios, tanto no que diz respeito a reduções na poluição quanto aos preços dos combustíveis em questão, são percebidas em São Paulo e Campinas, regiões com maior potencial de substituição de diesel por GNL e onde o diesel é mais caro do que no resto do Estado. Nossos resultados mostram que em São Paulo, o GNL pode ser até 60% mais barato que o diesel”, diz Dominique Mouette, professora da Escola de Artes, Cências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH/USP), autora principal do artigo e líder do projeto no RCGI focado na viabilidade de um Corredor Azul no Estado de São Paulo.
Barreiras regulatórias – Entretanto, apesar das vantagens econômicas e ambientais apresentadas, o GNL ainda enfrenta barreiras regulatórias para sua utilização generalizada no setor dos transportes. “Ele não é regulamentado para ser usado como combustível de veículos no Brasil. A maioria do GNV utilizado aqui é gás natural comprimido, o GNC”, afirma.
Saiba mais:
O artigo publicado na revista científica, intitulado Costs and emissions assessment of a Blue Corridor in a Brazilian reality: The use of liquefied natural gas in the transport, é assinado pelos seguintes pesquisadores: Dominique Mouette Denis Fraga, Drielli Peyerl, Pedro Gerber Machado, Raquel Rocha Borges, Thiago Luis Felipe Brito, Lena Ayano Shimomaebara e Edmilson Moutinho dos Santos.