Objetivo dos experimentos relatados pelos autores foi aumentar a estabilidade das nanopartículas e também a capacidade de adsorção de CO2 em sua superfície, melhorando a eficiência da fotossíntese sintética
Um grupo de cientistas do Fapesp Shell Research Centre for Gas Innovation (RCGI) acaba de publicar um artigo no Journal of Physical Chemistry C que representa um grande avanço na compreensão de como projetar fotocatalisadores cerâmicos mais estáveis para fotossíntese artificial e fotólise da água. A equipe é liderada pelo professor Douglas Gouvêa, do Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), e o autor principal do artigo é Andre Luiz da Silva, pós-doutorando na mesma instituição. Ambos são da equipe do RCGI e trabalham em um projeto que visa transformar o CO2 em produtos orgânicos com o uso de nanopartículas.
“O Journal of Physical Chemistry C é uma revista bastante importante, com muitos leitores, e que tem como especificidade publicar artigos sobre físico-química relacionados a fenômenos de superficie, interfaces, nanomateriais e catálise, que está diretamente associado ao que estamos fazendo no projeto 31 do RCGI. É a primeira publicação da equipe do projeto e há outras sendo finalizadas”, adianta Gouvêa. O projeto 31 está dentro do Programa de Abatimento de Carbono do RCGI.
Nele, os pesquisadores pretendem reproduzir com nanopartículas de óxidos semicondutores o que a natureza faz durante o processo de fotossíntese, partindo da absorção de luz, CO2 e água. Na fotossíntese natural, a clorofila absorve luz, transforma água em oxigênio e prótons, e usa os elétrons resultantes para poder fazer outras transformações dentro da célula. Elétrons e prótons são levados para outro ciclo orgânico, em que o sistema absorve CO2, posteriormente transformando-o em açúcar, ou seja, o carbono assimilado da atmosfera foi transformado e usado para outras aplicações.
Para alcançar esse objetivo, o primeiro passo foi estudar a estabilidade dessas nanopartículas, tema do paper recém-publicado (clique aqui para acessá-lo). A equipe focou a melhora a capacidade catalítica de nanopartículas de óxido de titânio, com a adição de substâncias como o óxido de bário (posteriormente também serão testados óxido magnésio, óxido de cálcio e óxido de estrôncio), para aumentar a eficácia do processo de fotossíntese artificial.
“O objetivo da série de experimentos inovadores realizados pelo grupo foi aumentar a estabilidade da nanopartícula e também a capacidade de adsorção de CO2 em sua superfície. O titânio tem tendência a adsorver água e, o bário, a adsorver CO2. Quando se aplica o bário à nanopartícula, a grande maioria vai para a superfície do grão. Assim, é possível aumentar a eficiência da fotossíntese sintética, que está diretamente conectada à eficiência da adsorção de CO2 pela partícula”, explica Andre Luiz da Silva.
Os cientistas trabalharam com conceitos como segregação de superfície (que é a capacidade do material aplicado de migrar para a superfície do grão), segregação no contorno de grão (a capacidade do material aplicado de se depositar na interface entre partículas que se tocam) e energia de superfície (uma medida de estabilidade da partícula).
“Pela primeira vez foi mostrado experimentalmente que a segregação de superfície, a segregação no contorno de grão e a energia de superfície estão verdadeiramente interconectadas. A quantificação dessas três grandezas nunca havia sido reportada experimentalmente em um mesmo artigo”, afirma Silva.
“É a primeira publicação em que conseguimos fazer a caracterização total do sistema. Mostramos que o bário vai para a superfície do material (segregação) e isso tem uma consequência energética para o sistema”, resume Gouvêa.
Para ele, o paper publicado no Journal of Physical Chemistry C é importante porque ajuda a entender como a termodinâmica é importante para a estabilização das partículas e como essa estabilização é fundamental para o processo de fotocatálise. O impacto do artigo já se desenha: a American Ceramic Society escreveu uma reportagem sobre o trabalho e publicou no Ceramic Tech Today (clique aqui para acessá-la).
Segundo os pesquisadores, a quantificação e as medições envolveram outras instituições e evidenciam um trabalho em equipe: a Universidade da Califórnia, Davis (UC/Davis), e o Laboratório Nacional de Nanotecnologia, em Campinas (SP).
“Toda a parte de medida de energia de superfície e de adsorção foi feita na UC/Davis. Eles são especializados em calorimetria, inclusive de adsorção, e têm equipamentos que pouquíssimas instituições no mundo têm. E aqui, no Laboratório de Luz Sincrotron, fizemos a quantificação da segregação”, lembra o professor da Poli.
Andre Silva revela que está sendo construído um microreator para testar a eficiência das nanopartículas. “A perspectiva futura é criar sistemas portáteis, como painéis de nanopartículas ativadas que possam ser usados em qualquer lugar. Mas é preciso primeiro testar a eficiência das nanopartículas na fotocatálise para depois pensar em qualquer tipo de protótipo.”