Cientistas estudam a possibilidade de usar reservatórios com matrizes adsorventes para aproveitamento dos boil-offs que acontecem em tanques de LNG transportados por navios.
Otimizar os aspectos termodinâmicos dos processos de adsorção e esvaziamento de reservatórios em que o gás natural é armazenado em matrizes adsorventes: este é o principal objetivo do projeto Otimização Baseada no Método Adjunto para Sistemas de Armazenamento de Gás Natural, do RCGI – Research Centre for Gas Innovation (Centro de Pesquisa em Inovação em Gás). Coordenado pelo dr. Ernani V. Volpe, membro do RCGI e professor do Departamento de Engenharia Mecânica da Escola Politécnica da USP, o projeto irá utilizar modelos matemáticos para melhorar tanto a quantidade de gás armazenada em uma dada matriz adsorvente quanto a sua capacidade de devolução desse gás para utilização.
Há diversas formas de armazenar o gás natural. As mais comuns são liquefazer o gás (o que gera o gás natural liquefeito, ou LNG) ou comprimi-lo (conhecido como gás natural comprimido, ou CNG). O uso da tecnologia de adsorção pode ser uma boa alternativa para armazenar e transportar o gás natural sem ter de usar altas pressões (caso do CNG), ou de lançar mão de uma planta de liquefação para obtenção do LNG, que deve ser mantido em temperaturas muito baixas (cerca de -160°C). A tecnologia pela qual o gás é armazenado em uma matriz adsorvente é chamada de ANG – Gás Natural Adsorvido.
O sistema de armazenamento por adsorção consiste na adesão das partículas do gás à superfície da parede do adsorvente, que pode ser o carvão ativado, mas também pode ser sílica gel, alumina ativada, zeolitos sintéticos ou naturais. “Para permitir que a matriz adsorvente capture o máximo possível de gás e, posteriormente, permita a maior retirada possível desse combustível pelo usuário, é necessário gerenciar as transferências de calor envolvidas nos processos de absorção e de esvaziamento do adsorvente”, explica Volpe.
Segundo ele, para otimizar esses processos, serão utilizados um modelo físico e um modelo de otimização conhecido como Método Adjunto. “O primeiro modelo trata da física do escoamento e responde à questão: como a física dos processos se dá? O segundo otimiza a solução que foi dada pelo modelo físico. Os dois modelos trabalham com a solução de equações diferenciais, utilizando o método dos elementos finitos. Para serem resolvidas, elas necessitam de métodos numéricos computacionais, o que é conhecido como CFD (Computational fluid dynamics).”
Ao final dos cinco anos de duração do projeto, a equipe, composta por Volpe, o pós-doc Marcelo Hayashi, e os doutorandos Bruno Chieregatti e João Brasil Lima, pretende entregar um pacote de softwares (programados pelos pesquisadores) que modele o problema de acordo com os inputs fornecidos e apresente soluções otimizadas para uma dada função objetivo. Esses resultados permitirão inclusive que se desenvolvam metodologias que possibilitem uma operação adequada da tecnologia.
“A ideia é que os usuários possam inserir os inputs referentes às matrizes que pretendem usar, e às condições de operação a que estão obedecendo, e o software devolva com os melhores processos possíveis de enchimento e esvaziamento dos tanques”, diz Volpe. De acordo com ele, além das variáveis de temperatura e pressão, os modelos criados pelo grupo também deverão trabalhar com inputs relativos à porosidade e à permeabilidade da matriz adsorvente e, caso seja possível, à alteração da geometria do tanque.
Aplicações – Uma das aplicações desenvolvidas no projeto acontecerá no setor de transporte marítimo de LNG. “Não existe isolamento térmico perfeito, por melhor que seja o sistema utilizado nos tanques de transporte de LNG por via marítima. Assim, quando o gás é transportado em estado líquido, e por conta das trocas de calor com o meio, parte deste gás retorna ao seu estado de vapor, o que a gente chama de boil-off. A estimativa de perdas por boil-off é da ordem de 0,1% do volume transportado por dia de armazenamento. Numa conta simples, considerando uma viagem oceânica típica de 50 dias, isso representa cerca de 4,88% do volume total do gás armazenado no navio. Por exemplo: em um navio que transporte 150 mil metros cúbicos de gás natural, isso corresponde a aproximadamente 7,3 mil metros cúbicos de gás evaporado.”
De acordo com o professor, esses boil-offs deveriam ser aproveitados. “O gás resultante pode ser usado para mover a própria embarcação, o que já ocorre em alguns casos, pode ser reliquefeito, o que exige que a embarcação tenha uma planta de reliquefação, aumentando seu custo operacional, ou na maioria dos casos, é simplesmente queimado e lançado na atmosfera, o que não se aconselha, em tempos de preocupações com emissões. Então, um dos meus alunos levantou a possibilidade de armazená-lo em um tanque provido com uma matriz adsorvente, pois quanto mais baixa a temperatura do gás, melhor o processo de adsorção ocorre. Assim, pretendemos estudar essa possibilidade, verificando sua viabilidade técnica e econômica.”